sexta-feira, janeiro 22, 2010

Hora dos Mais Novos


Pergunto ao vento que passa notícias do meu país
E o vento cala a desgraça e o vento nada me diz

Pergunto aos rios que levam tanto sonho à flor das águas
E os rios não me sossegam, levam sonhos deixam mágoas

Levam sonhos deixam mágoas, ai rios do meu país
Minha pátria à flor das águas, para onde vais? Ninguém me diz.

Se o verde trevo desfolhas, pede notícias e diz
Ao trevo de quatro folhas que eu morro por meu país

Pergunto à gente que passa por que vai de olhos no chão
Silêncio é tudo o que tem quem vive na servidão

Mas há sempre uma candeia dentro da própria desgraça
Há sempre alguém que semeia canções no vento que passa

Mesmo na noite mais triste, em tempo de servidão
Há sempre alguém que resiste, há sempre alguém que diz não!


Manuel Alegre






A idade, os anos vividos, o tempo de permanência nesta dimensão, todos os eufemismos usados para o simples termo velhice, dá aos que a possuem, aos que nela já estão instalados, uma riqueza que não contempla os mais novos, um capital de que não usufruem. 

Desde logo recordo a máxima usada por meu pai: os novos são tolos e não sabem disso, os velhos são tolos, mas sabem que o são. Esta tolice aqui usada, deve ter o sentido da bobagem, termo tão comum em todos os níveis de língua do povo brasileiro. Há um ditado também que afirma, na mesma linha, que de médico e louco todos temos um pouco, abusando, quantas vezes, num e noutro caso, com maior ou menor eficácia no resultado pretendido.

Há, no percurso da vida, o chamado período de graça onde tudo acontece, sem oportunidade já para as tolices da juventude que se vai distanciando, bombardeada por todas as vicissitudes compostas por realizações, interesses, responsabilidades, sobrevivência; a hora chegada do tempero, dos condimentos que irão marcar o sabor final. 

A velhice. O tempo das rugas e das cãs. O tempo de saborear o respeito dos outros pela sabedoria de vida, a experiência que os mais novos não tiveram e pode ajudá-los a pensar melhor, não mais do que isso. Porque é nestes que reside a força, a valentia, a vontade, o destemor da inexperiência que a soma dos anos vai apagando.

Na velhice, colados os rostos do passado e do presente, dos sonhos e da realidade, é o tempo do repouso, para sentir a paz, passar mensagens de vida, dizer que o amor permanece como presente aos vindouros, como dádiva ao futuro. 



3 comentários:

Justine disse...

Tão doce, a tua reflexão...
E eu continuo a afirmar, contigo, ue é bom envelhecer:))
Abraço

Rocha de Sousa disse...

Este texto de Jawaa, quanto a mim, supera a amável poesia convocada,
onde certos estereótipos abundam, mal afloram do coração, prestando-
se, contudo, a serem musicados, co-
mo acontecia com algumas belíssimas
peças de Ary.
Mas a Jawaa sabe misturar, sem mar-
teladar no sítio certo a melanco- lia que os modos acusam «fora de moda» e ela redescobre, em valores e sonhos, como lado bom da vida, mesmo (ou sobretudo) quando se usufrui de uma velhice sustentada e repousante. É quando se dizem as maiores verdades, concordo, mas a luz que Jawwaa põe neste belo fi-nal da sua breve reflexão parece-me pertencer ao domínio de uma grande dádiva pessoal ao futuro. Talvez pela crença, talvez pela fé (e apesar de tudo) no homem.
Repare-se na imagem que Jawaa nos propõe:as ervas teimosas crescem
entre as pedras da calçada, ordem
pré-exisente para a sua turbulên-
cia. Mas sobre elas, graves, sole-
nes e mortas, o «campo» enche-se dessa temível e belíssima verdade,
infinita mentira que escapda da
«eterna» juventude, da época fecun-
da e feliz, que nos deixa sorrir ao
dedilhar as primeiras e significa-
tivas rugas.

M. disse...

Sim, Jawaa, um tempo em que parece que o que fomos juntando ao longo da vida, quase sem darmos por isso, se ajusta dentro de nós como num ninho.