quinta-feira, abril 04, 2013

PRIMAVERAS

... Há uma Primavera em cada vida:
É preciso cantá-la assim florida,
Pois se Deus nos deu voz, foi pra cantar!

E se um dia hei-de ser pó, cinza e nada
Que seja a minha noite uma alvorada,
Que me saiba perder... pra me encontrar...
 Florbela Espanca








 Gerânios, pelargónios, até malvas, a tudo se dá o nome de sardinheiras e como tal as conheci desde sempre, as flores predilectas de minha mãe de quem herdei o gosto por flores, pela alegria que transmitem, quem sabe o apelo das suas cores vivas. Crescem em qualquer vaso, descem pelas sacadas, sobem rente aos muros, gostam de alguma humidade e calor. E afecto, acrescento. Como qualquer planta, como qualquer ser vivo.

A primavera está aí, a temperatura a dizer que passou o equinócio, o sol a romper por entre as nuvens apesar da chuva, e os campos cheios de cor, pintados de branco e amarelo. Além das sardinheiras, plantas de cultivo doméstico, há estas flores delicadas, simples, de pétalas ordenadas em forma de sol, de todas as cores, a que se dá o nome geral de malmequeres. Manéis, margaridas, bem-me-queres outros nomes mais que desconheço, mas malmequeres humildes, violentados pelas raparigas de outrora, humildes como eles, que os desfolhavam sem piedade procurando a resposta ao seu amor inquieto: mal-me-quer, bem-me-quer, muito, pouco, nada, os franceses usando uma gradação mais intensa: Il m’aime, un peu, passionément, à la folie, pas du tout.

São as flores da primavera e eu hoje quero apenas ver jardins floridos, sejam de cores vibrantes abertas ao sol, sejam cores de cinza e prata sorrindo à claridade da lua. Não importa se as nuvens cobrem o céu, o meu horizonte está para além delas, tenho o espaço do cosmos olhando por mim, para além da cortina de chuva, para além das águas que cobrem a terra. Tudo me pertence, o coração pulsa inundando as veias na alegria que não cabe dentro e se verte em lágrimas de emoção.

O mundo repousa agora no meu regaço, quieto, sereno, infinitamente doce, suave como aquela noite há quarenta e seis anos, quando ela floriu para mim, encerrando a Primavera.

1 comentário:

Manuel Veiga disse...

"perdi-me" nas tuas belas fotos e em teu delicadissimo texto...

não sabia dos "manéis" ... rss

beijo