sexta-feira, setembro 18, 2009

Pensar Portugal


«Há já longos anos que eu lancei esta fórmula: – Portugal é um país traduzido do francês em vernáculo. A secura, a impaciência com que ela foi acolhida, provou-me irrecusavelmente que a minha fórmula era subtil, exacta, e se colava à realidade como uma pelica. E para lhe manter a superioridade preciosa da exactidão, fui bem depressa forçado a alterá-la de acordo com a observação e a experiência. E de novo a lancei assim aperfeiçoada: – Portugal é um país traduzido do francês em calão. E desta vez a minha fórmula foi acolhida com simpatia, com rebuliço, e rolou de mão em mão como uma moeda de ouro bem cunhada e rutilante, que é agradável mostrar, fazer tinir sobre o mármore dos botequins.»

Eça de Queirós



Eça de Queirós, visto por Bordalo Pinheiro


«E a senhora, em quem vai votar?»


À ingenuidade desta pergunta, ocorreram-me pensamentos sugeridos pelo livro que tinha entre mãos. Felizmente, Portugal tem actualmente os seus pensadores, os que escrevem em português vernáculo, verbalizam inquietações, porventura sugerem caminhos de futuro. Não é sem tempo nem são de mais. Porém, todos sabemos que nós não somos um povo de intelectuais, e muitos dos que assim se rotulam, sofrem também de iliteracia.


Assim, para que Elogios, Contratos, Recados, possam chegar ao povo, tinir como uma moeda de ouro sobre o mármore dos botequins, é preciso que o vernáculo seja traduzido em calão. É que o povo vive nas ruas e nas feiras, nos lares de terceira idade, à porta das fábricas em greve, nos bares da noite e nos centros comerciais, nas filas dos centros de emprego, nos centros de formação, conduz carros de marca importados em segunda mão, goza férias no estrangeiro a prestações de cartão de crédito. Enche os hospitais com uma gripe que não é, corre aos centros de saúde para que lhe prescrevam os ansiolíticos de que não necessita.


Pois faça-se passar o recado por telemóvel – leia-se: em calão. Há que chegar ao povo que vai votar sem saber em quê, em quem, ou não vota porque nem sabe ler. Há que fazer sentir ao povo que a peste (não a gripe) está instalada (em Oran…) e não é só o médico – nem importa qual – que pode tratar dela. É a solidariedade, o trabalho, a dedicação, a tolerância, a união entre todos que pode salvar a cidade.


E ainda na sequência daquela interrogação, faço a mim própria a pergunta – certamente sem resposta, como a primeira – se os Centros de Novas Oportunidades não terão a função pedagógica de fazer despertar o sentido de responsabilidade pela evolução individual e participação social na exigência de um Portugal mais íntegro, se não será este o calão necessário para que se faça brilhar a moeda.


Para já, voto na JUSTIÇA.


7 comentários:

Justine disse...

Ai, amiga, vai ser preciso tanto tempo, tanto trabalho, tanta luta para que a mensagem chegue ao povo. Porque vai ser preciso furar as barreiras da iliteracia, da comunicação social ao serviço de uma classe, da indiferença. Mas cada passo é um passo mais nesse caminho...

M. disse...

Pois é, às vezes quase desanimamos...

PreDatado disse...

Seguindo o comentário da Justine lembrei-me de uma frase que li um dia destes algures num espaço brasileiro: "O pior é que quem vota não é só quem lê os jornais mas principalmente quem limpa a bunda com eles". Falta ainda algum tempo para que todos leiamos jornais.

Rafael Almeida Teixeira disse...

Passei o dia a lembrar deste blog encantador.

Sobre a JUSTIÇA, prefiro a cega.

Abraços afetuosos.

Manuel Veiga disse...

"água mole em terra dura..."

persistir, persistir. sempre. sem desânimos...

beijo

Luíza Frazão disse...

Querida amiga,

Tem um selo à sua espera no meu blog.

Um abraço

Luíza Frazão

Rocha de Sousa disse...

Mi amicª, di pov é compl. mui temp
pª convenc-er. Simpl o k. é? Ist.
bué mas enão como? Just iça ñ há.
V.tar just iça é voto nulo.
As. simples nte seu
J.


Diseram-me que esta era a nova grafia para entendimento do povo, sobretudo dos jovens que gostam bué de votar SMS. Assim, para a namorada:
amô bué-te.