quinta-feira, julho 02, 2009

Território


Agora que o silêncio é um mar sem ondas,

E que nele posso navegar sem rumo,
Não respondas
Às urgentes pergun
tas
Que te fiz.
Deixa-me ser feliz

Assim,
Já tão longe de ti como de mim.


Perde-se a vida a desejá-la tanto.
Só soubemos sofrer, enquanto

O nosso amor
Durou.

Mas o tempo passou,
Há calmaria...
Não perturbes a paz que me foi dada.

Ouvir de novo a tua voz seria
Matar a sede com água salgada.

Miguel Torga



Aquele espaço das vidas que construímos, onde colhemos os frutos e semeamos as flores, nos rasgamos nos espinhos, onde aspiramos fragrâncias e cheiramos ventos que trazem outros sentires, é o chão que pisamos e nos prende à Terra. Como uma árvore plantada. Ou um pássaro que sabe cruzar oceanos ou o animal marinho percorrendo as águas. Ou ainda o ser que deambula deixando pegadas, odores, sulcos e cadáveres nos caminhos percorridos.

O Homem é o ser sem limites. Constrói pássaros em aço e atravessa os mares, liga os continentes, sobrevoa a imensidão das águas correndo atrás do dia e, quando pousa, faz uma vénia ao sol para que dê entrada no Ocaso. É deslumbrante participar em consciência desta força a ombrear a natureza, a mostrar à saciedade que está à sua altura, que sabe os seus caminhos, que conhece as rotas que ela percorre. Só não as pode alterar, e não deve, que ela é sempre mais forte, é a fêmea que procria.

A demência instala-se quando os seres não se respeitam entre si, onde a diversidade não tem lugar. Onde os lugares são preenchidos pelo mesmo odor a gente em espaço fechado, suor, carros e betão, abafando os campos, alargando a ferida do planeta-mãe. Ou lhe dão espaço e tempo de regeneração, ou ela esgota-se.


4 comentários:

Rocha de Sousa disse...

Não só Jawaa voou, nos altos céus entre continentes, desfrutando toda
a grandeza das coisas vistas do ar, sempre belas, como olhou, descansada, através dos vidros,
sonhada sonhando os afectos, a
repensar a condição do homem, os muitos lugares onde o amontoado de
corpos e os cheiros da miséria se acumulam, sufocantes.
As contradiçõe do mundo são, cada
vez mais, aterradoramente insanáveis.

Paula Raposo disse...

Um texto belíssimo e desassombrado! Muitos beijos.

pianistaboxeador21 disse...

Estou ouvindo a música ao nosso filho, morena do oswaldo montenegro e tem muito a ver com tudo o que vc escreveu.
muito bom.
abraço.

M. disse...

O prazer de te ler. Seja qual for o lugar onde poisas.