terça-feira, fevereiro 12, 2008

O Vestido Azul

O meu país sabe a amoras bravas
no verão.      
Ninguém ignora que não é grande,
nem inteligente, nem elegante o meu país,
mas tem esta voz doce
de quem acorda cedo para cantar nas silvas.
Raramente falei do meu país, talvez
nem goste dele, mas quando um amigo
me traz amoras bravas
os seus muros parecem-me brancos.
Reparo que também no meu país o céu é azul.
                       Eugénio de Andrade


O azul é a cor por excelência.

A cor do mar. A cor do céu limpo. De certeza a cor que primeiro identificamos, assim que somos dados à vida. Nem sei se haverá alguém que não goste de azul. Na reconhecida ausência de vocábulos à altura de designar a multiplicidade de tons, assim o designamos azul-claro, azul-escuro, azul-marinho, azul-mar, azul-cinza, azul-eléctrico, azul-petróleo e mesmo azul-céu, a cor do infinito.

Por mim, não posso dizer que tenha uma cor preferida. Gosto de cor. Gosto das cores. Da união de todas elas. Menos da ausência, mas também.

Hoje, porém, queria trazer aqui apenas o azul, porque um amigo deste espaço aberto, por delicadeza, grato por coisa quase nenhuma, mandou-me uma flor azul em forma de som.

Acontece que eu não consigo postar o vídeo que ele me mandou e já desisti de pedir ajuda ao Blogger.

Sobre um fundo sonoro, um narrador conta a história de «uma garotinha muito bonita morando num bairro pobre de uma cidade distante […] frequentava a escola local e se apresentava quase sempre suja, suas roupas velhas e maltratadas. O professor ficou penalizado […] separou algum dinheiro e resolveu lhe comprar um vestido novo.

Ela ficou linda no vestido azul.

Sua mãe passou a lhe dar banho todos os dias, pentear seus cabelos, cortar suas unhas […] Nas horas vagas, o pai resolveu dar uma pintura nas paredes, concertar a cerca e plantar um jardim. Os vizinhos, envergonhados, decidiram também arranjar suas casas, plantar flores, usar pintura e criatividade […] um religioso pensou que bem mereciam o apoio das autoridades […] e o bairro ganhou ares de cidadania.

E tudo começou com um vestido azul.

Não era intenção daquele professor concertar toda a rua nem criar um organismo que socorresse o bairro. Ele fez o que podia. Deu a sua parte. Fez o primeiro movimento. […] Lembremos que é difícil limpar toda a rua, mas é fácil limpar a nossa calçada. É difícil reconstruir um bairro.

Mas é possível dar um vestido azul.»

O meu amigo é um menino-poeta, que tira fotografias lindas e gosta de música e estuda, para ser maior no mister em que dá os primeiros passos. Tem uma sensibilidade do tamanho do mar que nos separa e sabe comunicar. Quer ser professor. Que bonito!

Muito obrigada pela flor, Rafael.



7 comentários:

mena maya disse...

Jawaa,

é linda esta história, contada com tanta simplicidade e que tanto nos faz pensar...
É bem verdadeira a sua mensagem!
Já conhecia o blog do Rafael e concordo contigo a 100%.
Temos artista!

Ah e azul é a minha cor preferida , desde sempre!

Um beijinho

M. disse...

A simplicidade de uma história que nos faz acreditar que os gestos do ser humano não se perdem por aí.

Sant'Ana disse...

O azul é o tecto dos poetas.

Aqui a tua mão um tecto, as palavras correm, como sempre, como "levadas" (termo da Beira)que dessedentam os campos da imaginação.

Parabéns ao dois, uma flor para ambos.

Manuel Veiga disse...

azul de amoras bravas...

bom proveito. carpe diem..

rui disse...

Olá Jawaa

É lindo o que nos contas!
Um pequeno gesto moveu a vontade de muita gente.
Adoro o azul, mas o que me faz espantar é o azul anil.

Abraço

Rafael Almeida Teixeira disse...

Você faz-me rir, sonhar, imaginar, chorar,... mais feliz.

Abraços afetuosos e obrigado pelo carinho.

Rocha de Sousa disse...

O azul, sim, atmosférico,ocultando
durante a noite as muitas moradas do Pai, para nos aliviar da sua se-creta e impossível imensidade, beleza falaciosa. Mas a história do Rafael é mais do que uma lem-bramça do azul atmosférico, a cor da vida que nos alimenta e alimenta
o planeta. O carinho posto na recepção desta mensagem, entre os sinais imaginados da sagração dos nossos sonhos, é mais um momento de
serena convicção sobre a alma limpa
de azul, na sabedoria da sabedoria
das outras, sem uso do preto nem mesmo do branco.
Rocha de Sousa