quinta-feira, novembro 23, 2006

Quem não gosta do arco-íris?

«- Louco, você? Só porque consegue entender as árvores ou falar com as coisas? Bobagens! Loucos são os outros homens que perderam a poesia de Deus, que endureceram o coração e nem sequer podem entender os próprios homens. Esses são loucos.»

José Mauro de Vasconcelos



Já não rego as flores do jardim, que o meu jardim é desvario. Depois, a relva não esconde a sua preferência por outros amores, revela bem o seu derriço à carícia da água que lhe vem directamente dos céus.

Todavia sinto falta do arco-íris pequenino com que o sol me presenteia à sua despedida, ao fim do dia, no repuxo fino que faço sair da mangueira de rega. O mesmo arco-da-velha da minha infância, quando aparecia enorme nas nuvens escuras que traziam a trovoada e a chuva. Também o manto-de-deus porque perfeito como ele, redondo, redondo, e às vezes repetido, a dizer que Deus estava ali para proteger os meninos dos relâmpagos e trovões. Bem mais tarde, aquele deslumbramento ao vê-lo pairar por sobre as águas do Niagara, antes do sol-pôr.

Lobo Antunes disse numa entrevista recente que tem alguma dificuldade em falar da idade, porque cada um de nós tem a idade com que nasce. De acordo, incondicionalmente. Falou ele, senti eu. Há quem seja velho quando nasce, há quem seja sempre menino. Há quem cresça devagar e quem nunca envelheça. Há quem envelheça sem nunca crescer.

Há decerto uma idade ideal em cada ser que permanece para todo o sempre e aflora aqui e além, para lá das rugas, do olhar nublado, do sorriso ou do franzir do cenho. Também nas palavras. Independentemente dos anos contados, dos êxitos, das vicissitudes, das angústias, dos desejos alcançados, das saudades, dos anseios mais fundos nunca concretizados.

E é por isso que eu gosto do arco-íris. É a curva mansa e perfeita do esplendor da vida nos tons completos do universo. Os que o nosso olhar distingue e todos os outros que não vemos, mas estão lá, no espectro solar.

1 comentário:

Anónimo disse...

Gostei muito que me tivesse deixado
no meu espaço algumas palavras.Não
tenho agora muito tempo para comentar o seu excelente trabalho, mas, a propósito do´arco iris, eu tive o privilégio, no alto da floresta em Angola, após a tempestade, ver o imenso espaço verde carregado em sucessivos cruzamentos de vários arci-iris, podendo mesmo fotografar um que «começava» a meus pés.
Um até breve
Rocha de Sousa.