segunda-feira, fevereiro 11, 2013

OUTRA VEZ CARNAVAL

Ao longe os montes têm neve ao sol,
Mas é suave já o frio calmo
         Que alisa e agudece
         Os dardos do sol alto.

Hoje, Neera, não nos escondamos,
Nada nos falta, porque nada somos.
         Não esperamos nada
         E temos frio ao sol.

Mas tal como é, gozemos o momento,
Solenes na alegria levemente,
         E aguardando a morte
         Como quem a conhece. 

 Ricardo Reis






O apelo da juventude, aliado à fascinação do que ainda é perfeito na constituição do corpo humano, é algo a que se não pode fugir. O mundo que nos rodeia é cada vez mais envelhecido, apesar de todas as fórmulas encontradas para tentar manter inalterável aquilo que a irreversibilidade da natureza nos concede. Voltar para trás nunca é solução, salvo no que respeita às fundações de nós, as raízes, os caboucos da nossa personalidade, até o aspecto físico que beneficia uns mais do que outros. 

Congratulo-me com a postura dos que já ultrapassaram o meio século de vida, há poucas décadas ainda olhado como a recta final, mas hoje, para a grande maioria, apenas atravessada metade da vida útil. Vai sendo tempo de se refazer mentalidades, encontrar fórmulas de educar os jovens para uma percepção diferente do que é um idoso, ilibando-o do sentido de caducidade quase sempre fartas vezes ofensivo, e educar também os mesmos idosos para comportamentos de postura de verticalidade, a quem os anos contados não dão o direito de fugir às regras que regem o comum dos mortais.

Camões, o eterno poeta que atravessou os séculos, não contou histórias dos outros, contou de si, das suas infelicidades «o dia em que nasci moura e pereça», cantou dos seus «as armas e os barões assinalados», disse em tempo, o que não tem tempo de validade «mudam-se os tempos, mudam-se as vontades». E assim verdadeiro, como ele vaticinou, assim mudam os tempos e as festas pagãs conseguem impor-se atravessando os séculos, o Carnaval a encher as ruas mesmo debaixo de chuva, a fazer esquecer por algumas horas de folia o desemprego e o desvario de muitos em actos tresloucados, perturbados pela falta de perspectivas para o futuro próximo e longínquo. 

Também mudam as vontades, a forçarem substituir as máscaras venezianas do Carnaval europeu pela nudez exuberante da juventude dos climas tropicais que chega a incomodar o próprio frio.
 

1 comentário:

Manuel Veiga disse...

corpos dados às balas ... da alegria de plástico.

sensivel e inteligente. sempre.

beijo