segunda-feira, dezembro 12, 2011

À espera de Godot

Moi quand je serai vieux
tout sera encore mieux
Même si j'ai plus qu''une dent
j'en grincerai joyeusement
Elle mordra dans la vie
avec la même envie
Même si j'ai plus qu'un cheveu
je le peignerai de mon mieux
J'irai lhe cheveu au vent
je prendrai du bon temps
je ferai des projets
des projets d'avenir
Et si ma mémoire m'oublie j'en profiterai
pour oublier de mourir


 1º Prémio num concurso do Metro de Paris, Pierre Bichaud




Acordo dentro do nevoeiro, a chuva o frio lá fora e cá dentro o meu corpo grita de desconforto.
Decididamente não fui programada para uma natureza longamente agreste, sem a doçura de alguma luz abrindo a janela que ainda mantém os vidros, frágeis, mas onde a humidade chora por dentro em sulcos que escorrem como lágrimas. O abandono, o desafago, o desprazer, a desesperança, a solidão, tudo me ocorre em sopetão no calor da casa.

Ouço dizer que os ricos não querem falar do muito que possuem, menos ainda dividir com aqueles que têm pouco. As pessoas, as famílias, os concidadãos, os estados, os países do mundo. Mas ocorre-me pensar se todos os que realmente têm pouco – ou os que nada têm – desejam por acaso a riqueza dos outros. É que, para além de eu ter a certeza de haver quem não deseje, resta ainda descortinar o que significa ter muito ou ter pouco, qual é o modelo, quem é que define, quem estabelece os limites, que limites. 

E neste afã de tentar encontrar respostas que não existem, está subjacente uma ideia de hierarquia que as religiões logo usurparam do inconsciente humano, a existência de alguém que nos possa orientar quando o nevoeiro desce sobre o mundo, sobre nós. Se queremos caminhar e não estamos sós, por que não dar as mãos e seguir, na certeza de que, se algum cair, o outro, os outros, não deixarão que aquele se afunde no abismo?

Por que não acreditar na nossa força de crescer e seguir em frente em vez de ficarmos sentados à espera de um ente supremo, um qualquer D. Sebastião?

 

3 comentários:

Manuel Veiga disse...

excelente pergunta. e atrevo-me a acreditar que conheces a resposta...

reconfortante. teu texto...

beijo

M. disse...

Tenho vindo a ler-te com muita atenção. Um enriquecimento do pensamento para mim.
Um beijo

Rocha de Sousa disse...

D. Sebastião, mesmo travestido, já
morreu. Só nos resta abandonar as ci-
dades das Merkels e avançar para o
interior, refazendo uma biológica
forma de estar: em escassez e em
solidariedade.