Senhor meu. Casa limpa. Mesa asseada. Prato
honesto. Servir quedo. Criados bons. Um que os mande. Paga certa. Escravos
poucos. Coche a ponto. Cavalo gordo. Prata muita. Ouro o menos. Jóias que se
não peçam. Dinheiro o que se possa. Alfaias todas. Armações muitas. Pinturas as
melhores. Livros alguns. Armas que não faltem. Casas próprias. Quinta pequena.
Missa em casa. Esmoça sempre. Poucos vizinhos. Filhos sem mimo. Ordem em tudo.
Mulher honrada. Marido cristão; é boa vida e boa morte.
D. Francisco Manuel de Melo in «Carta de Guia de
Casados»
Na celeridade dos dias que antecedem o
desconforto do inverno, estes dias serenos de outono chegam, gratificantes,
restauradores de alguma paz, após um longo verão escaldante e castigador da
incúria dos homens, a vergasta descendo principalmente sobre os mais puros, os
mais generosos, os mais jovens.
O mundo actual vive sobre os limites, sobre o
improviso, contando excessiva e impropriamente com a tolerância dos outros. Os
governos desgovernam o que lhes é dado para guardar ao longo de vidas, não se
dedicam ao mister de que estão investidos, não estão preparados, não têm
estratégias, assentam a sua actuação no improviso, na impulsividade da
juventude, não têm sabedoria, não ouvem a experiência.
A vida não é fácil, nem sempre é bonita, mas
pode tirar-se dela a beleza possível num dado momento, depois das vicissitudes,
dos desastres, das ausências. Porque há sempre um olhar para trás, de mão dada,
que compensa a fuga da insanidade dos anos.
No último fim-de-semana aconteceu um desses
momentos raros em que tudo se esquece para aquecer os velhos afectos, aqueles
que nunca esmorecem porque caldeados nas mesmas adversidades, nos mesmos
contentamentos, nos mesmos caminhos palmilhados.
Cinquenta anos é muito tempo. Já éramos
amigos há vinte anos atrás destes cinquenta. Éramos meninos e éramos felizes.
Éramos meninos e donos do mundo. Hoje não somos donos de nada, salvo deste
afecto que nos faz remoçar, sempre que a ocasião se nos oferece. Olho os netos
que não são meus e crescem distante, abraço os filhos que vi nascer e cresceram
com os meus, hoje espalhados por mundos tão longe, Praga, Roterdão,
Clermond-Ferrand, Friburgo, Luanda, Toronto, Porto, Coimbra, Lisboa, a estudar,
a trabalhar.
Foi num lugar bonito junto ao rio Liz o nosso
encontro, perto da sua nascente e ainda liberto da poluição de Leiria. Que a
vida permita aos meus amigos/irmãos continuarem juntos enquanto souberem e
puderem dar-se as mãos com a mesma ternura.
5 comentários:
É bom apertar os laços afectivo.
Quanto à citação, nunca percebi lá muito bem como é o autor, solteirão, se aventurou a dar orientações a casais...
Bons sonhos
São mesmo necessárias estas abstrusas letras de verificação??
Tem horas que tudo que precisamos é uma mão amiga.
Tua escrita me faz viajar, quando entendo viajo mais longe.
Abaços afetuosos. \0/ \0/
há momentos assim - refulgentes! - sublimados nos afectos.
beijo
há momentos assim - refulgentes! - sublimados nos afectos.
beijo
Reflexões com as quais concordo plenamente. Acertou!
Enviar um comentário