domingo, maio 15, 2011

Devagar se vai longe


Regresso devagar ao teu
sorriso como quem volta a casa. Faço de conta que
não é nada comigo. Distraído percorro
o caminho familiar da saudade,
pequeninas coisas me prendem,
uma tarde num café, um livro. Devagar
te amo e às vezes depressa,
meu amor, e às vezes faço coisas que não devo,
regresso devagar a tua casa,
compro um livro, entro no
amor como em casa.

Manuel António Pina (Prémio Camões 2011)




No sorriso das palavras o mundo todo se aconchega.

É alegria e dor ao mesmo tempo, aberta e partilhada ou então escondida atrás dum rasgar de face que os olhos não acompanham no brilho.

Nada é totalmente como queremos, é sempre mais ou menos, daquilo que desejamos embora uma e outra, dor e alegria, se ofusquem num determinado momento, dando azo a momentos únicos de explosão de raiva ou alacridade que nos dão algum fôlego para continuar em frente, porque nada volta para trás.

Tudo se constrói a partir do momento em que vivemos e nos damos conta do terreno que pisamos, se é chão duro e seco, se dele ascende o odor da chuva fecundando a terra, se é lodaçal ou areia movediça onde o corpo se afunda devagar.

Portugal tem um chão de verdade, chão quase milenar, tem terra firme, donde sobe o cheiro doce da terra molhada, numa profusão de continentes, tem como senhora única uma Língua imensa e forte que está acima de todos os impérios, reis ou príncipes forjados pelos homens. É uma Língua que nasceu vulgar do Latim dos clássicos, que se misturou de celta, de galego e de lusitano, que mergulhou sem medo nos oceanos e as ondas levaram e semearam e germinaram em crioulos e em tonalidades doces de inflexão peculiar por essas praias além.

Havemos de fazer com ela o ramo de oliveira que um dia uma pomba branca trouxe para a Arca a dizer que os tempos maus já eram idos e que havia terra fecunda à vista.
 

5 comentários:

bettips disse...

O ramo
e oliveira do nosso aqui e agora.
Em ponte de palavra comum.
Como dizia hoje a alguém: "África, onde temos a sepultura e a herança".
Materializadas, e felizmente, em pessoas como tu.
Bj

Justine disse...

Enternecedor e belo o teu passeio pelas mecigenações da nossa língua, nossa âncora e nosso futuro!

Rocha de Sousa disse...

Claro que devagar se vai longe. Não
foi dessa maneira, ao longo de mi-
lhões de anos que as formações ce-
lulares exíguas, pé ante pé,chega-
ram ao modo de constituição de or-ganismos cadavez mais complexo até determinarem o vértice luminoso do homem,do,cérebro,visão,motricidade planos mentais,emocionais e da razão que a consciência acolhe e relaciona.
Pode um dia haver um futuro harmo-
nioso e feito de beleza e paz. Mas
não há, agora, nenhum verdadeiro indício nesse sentido. APELEMOS.

Anónimo disse...

Um acaso, a gente encontrar-se... uma caso vermos comentários no passado. Eu não tenho accionado nada que me diga que a ou b acabaram ou comentaram. É quase uma intuição, os caminhos que vou percorrendo.
"Depois"
quando a palavra fluir do sentimento, falarei do livro que ainda leio, à noite - que não é livro que mereça ser lido "por aí".
Eu também saio, de casa, pouco. Saio muito mais pelos amigos a que me fui habituando, este 5 anos de PPP. Cada vez mais recreio as palavras da memória. Procuro um lugar inconsistente ... e fico-me.
Agradeço o teu "ensino", acrescenta-me.
Beijinho I.
da bettips

Manuel Veiga disse...

saudades de Futuro! belíssimo

o "nosso" padre António Vieira iria gostar...

beijos