sexta-feira, junho 13, 2014

BICHOS



J'ai toujours aimé la mer sur les plages. Et puis sur les plages désertes de ma jeunesse la boutique a proliféré. Maintenant je n'aime plus que le milieu des océans, là où l'existence des rivages paraît improbable. Mais un jour, à nouveau, sur les plages du Brésil, j'ai compris qu'il n'est pas pour moi de plus grande joie que de fouler un sable vierge à la rencontre d'une lumière sonore, pleine des sifflements de la vague.

Albert Camus [Carnets]



  

Partilhar uma alegria é tão mais premente do que abrir as palavras à dor.

Talvez porque a alegria é breve e se esquece, como o sonho se esvai ao acordar do dia, mas o pesadelo persiste e existe e assusta até ao novo período do anoitecer, no receio de nova presença, o medo intraduzível apertando o coração dos homens, no pavor das tormentas que o céu derrama, ainda que saibamos que logo a tempestade traz a bonança, assim haja tempo na vida que sobra.

Daí a procura insana dos tempos breves, jocosos, inesperados quase sempre, outras vezes gozados antes do tempo programado. Porque a concretização é fugaz como o arco-íris que e anuncia a chuva. Depois, tudo é relativo: o que a uns parece breve a outros é um pedaço de existência, uma batalha, um território a defender, um ciclo de vida a cumprir.

Um jardim, um relvado, um vaso onde pousa uma arbusto alto, um pau que o segura dos ardores dos ventos. Um pisco corajoso pousa e pipila e roda e reclama da presença de um gato pouco lesto mas astuto que se escuda por baixo da folhagem. Ali, a dois passos de mim, a angústia de um progenitor defendendo a prole, quem sabe desviando as atenções do ninho próximo, não chega para apagar o deslumbramento pelos seres da natureza pródiga, o respeito pela inteligência dos não humanos.

Gosto de bichos. Gosto de gatos que fazem o favor de dividir comigo o território que é deles e mo demonstram a cada espaço: um campo relvado é sempre um espaço verde, um espaço convidativo, seja um campo de bola ou de golf, um jardim aparado, um coradoiro de roupa, seja um campo de trigo povoado de papoilas.

No limite, uma manta colorida para cobrir uma cama de criança.

1 comentário:

Manuel Veiga disse...

gostei muito do texto - de uma sensibilidade vibrante como a brisa em fim de tarde...

talvez um dia te surpreenda o cantar de um melro no teu jardim - que o pipilar do pisco é um pouco monótono.

beijo