«É um nome
latino, não é? Eu perguntei a meu pai desde quando havia Lispector na Ucrânia.
Ele disse que há gerações e gerações anteriores. Eu suponho que o nome foi
rolando, rolando, rolando, perdendo algumas sílabas e foi formando outra coisa
que parece “Lis” e “peito”, em latim. É um nome que quando escrevi meu primeiro
livro, Sérgio Milliet (eu era completamente desconhecida, é claro) diz assim:
“Essa escritora de nome desagradável, certamente um pseudônimo…”. Não era, era
meu nome mesmo.»
Clarice
Lispector
O canto magnífico da primavera impõe-se ao rigor de um inverno
desusadamente tempestuoso, inverno a sério a lembrar outros rigores já
de si tão penosos que ensombram vidas e destroem laços, que deixam
marcas fundas sem remissão.
Mas o planeta gira e o mundo avança, o alarido dos pardais está ai a aproveitar as réstias de sol que conseguem escapulir por entre as nuvens de cenho carregado, um sopro morno que vem pontear de rosa o pessegueiro, vestir de branco a ameixoeira, os jacintos subindo garbosos do chão onde dormiram desde o verão.
Há odores que pairam, se desprendem por antecipação das cerejas que hão-de surgir deste branco intempestivo que assim profana a sisudez do tronco aparentemente envelhecido.
Parece que hoje já é Carnaval. Parece que o sol vai deixar que o povo saia pelas ruas disfarçado de si, soltando os espíritos à boa maneira dos antigos e dos ditos incivilizados, a expurgar em danças e sons o que já não cabe dentro, a zombar dos cabeçudos que não se compadecem das dores alheias.
Com certeza os dias já nos dão mais horas de luz, com certeza a temperatura vai subir uns poucos graus, com certeza a vida vai continuar a fluir, depois do Carnaval, depois da Troika, depois das Coligações, das Eleições.
Sem certezas, o mundo na ponta da Europa, o mundo tão injusto, um mundo cada vez mais insano, o mundo tão perto, franze também ele o sobrolho e estremece ainda mais a Natureza.
2 comentários:
reflexos luminosos de teu Mundo interior...
beijo
Foi o Carnaval, ficaram as péta-
las murchando numa Ucrânia cujo
destino talvez não se limite à
perda da Crimeia.
É difícil inventar maior farsa
atrás das portas douradas que se
abrem ao andar czarista de Putim
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