De sua mão tombam os cadernos. Movidas por um
vento que nascia não do ar mas do próprio chão, as folhas se espalham pela
estrada. Então, as letras, uma por uma, se vão convertendo em grãos de areia e,
aos poucos, todos meus escritos se vão transformando em páginas de terra.
Mia
Couto
Bebo com sofreguidão as palavras que
conseguem esfumar dentro do pensamento todos os credos, todos os medos, todas
as sensações desagradáveis que a civilização lança sobre os corpos cansados da
vida que já não dominam.
Todos os esforços não serão vãos, se houver
encanto que chegue para olhar de frente o que nos espera quando as experiências
se acumulam e um passo mais pode não ter a firmeza da expectativa em que se
apoiava. Por outro lado, a mesma experiência nos diz que tudo se resolve com o
passar dos anos, que o tempo tem tanto tempo quanto tempo o tempo tem.
E o tempo tem muito tempo. Ele acrescenta-se,
sobrepõe-se, quantas vezes a dificuldade está apenas no facto de não se saber
aceitar o tempo certo da mudança, porque ela ocorre devagarinho, por dentro e
por fora, é suave na sua inexorabilidade.
E é bonita. Os passos são mais lentos, é mais
lento o acordar, o levantar, só o pensamento acode descontrolado na medição dos
tempos, o hoje e o ontem brigam mas logo se aquietam, o hoje é mais fácil, sempre
mais fácil, cada vez mais fácil apesar da nostalgia do passado, que não é mais
do que isso.
Amar é igual, a entrega é igual, apenas o
jeito difere, quando se sabe amar de verdade.
1 comentário:
suave como um toque de seda...
o tempo apazigua, sim.
beijo
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