Sobe de um maciço de
outros cactos rasteiros, de folhas grandes carnudas, e é belo assim solitário
no ar. Fala com o mar por cima da casa, eu ouço. Ou não diz nada e eu ouço
também. É belo olhá-lo sempre que o olho pela primeira vez, no seu delírio de
Deus. Ou acena aos barcos que passam ao largo e lhe levam o aceno para todos os
possíveis da Terra. Mas o que mais me fascina é a visibilidade do mar.
Sobretudo quando o olho de dentro de casa, para cá do parapeito da janela,
donde ele não tem o ininteligível todo. Porque fora, leva-me consigo e larga-me
à desorientação que é imensa como um susto infantil.
Vergílio Ferreira in «Na
tua Face»
Olho a beleza final da
rosa vermelha que foi botão quase negro. Não sei o porquê, nunca consegui
fixar-lhe a cor na máquina fotográfica, não a tonalidade que os meus olhos
vêem. Já tentei a madrugada, o sol-pôr, o céu nublado e o sol vibrante. A cor
que eu vejo, a objectiva não capta. Serão os meus olhos preconceituosos?
Tão difícil como fazer
passar uma mensagem. Tão fácil como encontra-la visível naquilo que é dito com
intenção diferente da que aparece, tudo produto da inteligência dos homens que
encontra caminhos que Deus não conhece.
O céu mantém-se
teimosamente escondido no cinza das nuvens que pairam altas e com elas, abaixo
delas, vejo uns pássaros que voam alto, que planam, que não consigo identificar
mas que comprovadamente não são aves de rapina pois não andam em grupo, não são
gansos nem patos selvagens, nem corvos, menos ainda andorinhas ou pombos. Tenho
quase a certeza de que são gaivotas e não compreendo o que procuram elas por
aqui, não creio que haja tão grandes tempestades no mar para que procurem a
terra larga.
Olho a rosa vermelha e
comparo-a com a que desabrocha ao lado, rosa realmente cor-de-rosa, mais pura,
mais fina, perfeita no mesclado a branco, mais invulgar, porventura mais bela.
Porém mais frágil, mais breve, desfolhada à mais leve brisa.
Como os Homens, que não
devem ser marcados pelos anos que regista o calendário, antes pela força que
emanam, pela cor da sua mente, pela bravura em arrostar as brisas os ventos o
sol que lhes não queima a pele. Apenas enruga, escurece, embranquece. Os anos
deveriam ser contados pelas pescarias, pelas caçadas, pelas guerras, pelos
exílios, pelos regressos. Contados pelas perdas, pelos êxitos, pelos insucessos.
E um dia acabar
naturalmente, desprender a última pétala, como uma rosa vermelha.
1 comentário:
o homens deviam ser, sim. como dizes...
... náufragos de um tempo de cinza. embora...
bela a tua escrita. delicada e sensivel. como pétala tombando na tarde...
beijo
Enviar um comentário