terça-feira, abril 12, 2011

Um Inquieto Acontecer

Não é propriamente um romance, mas um longo testemunho, de quase quinhentas páginas, entre a crónica e o diário, sobre a guerra colonial. Embora muito bem escrito, por um pintor e excelente crítico de arte, Rocha de Sousa, falta-lhe talvez vibração e arte literária para ser o texto fundamental que poderia ser sobre a monstruosa e tão dramática aventura que tantos portugueses viveram e que os marcou para sempre. No entanto, está lá todo o essencial: a chegada das tropas a Luanda logo no início da guerra, em 1961, a escassez de tudo, o tempo do marasmo e o tempo do horror, os feridos e os mortos, a tortura dos guerrilheiros presos, o seu silêncio sobre o que não deviam dizer e o modo impressionante como tratavam por «meninos» os jovens oficiais milicianos da tropa portuguesa. Há a saudade da mulher amada, as histórias dos soldados, o medo das minas e os estropiados. Há a habituação a tudo, o desprezo pela retórica bélica do regime. Há o bom senso. Há neste livro uma honestidade absoluta.


Urbano Tavares Rodrigues, 1999

sobre «"Angola 61: Uma Crónica de Guerra ou a Visibilidade da Última Deriva»


Os dias sucedem-se amenos numa natureza quieta, a primavera enchendo tudo de verde e colorido, enquanto do outro lado do mundo a terra treme continuamente e os homens tentam em vão emendar os erros cometidos, erros que irão afectar todos nós, mais tarde ou mais cedo.

Mas por aqui a hora é de vésperas e não é justo sofrer por antecipação,
que a vida passa, e não estamos de mãos enlaçadas.
                (Enlacemos as mãos).

Vai ser lançado mais um livro de Rocha de Sousa, «Talvez Imagens e Gente de um Inquieto Acontecer», para mim a quinta obra sua lida, depois da que vem citada na abertura deste post, numa recensão de Urbano Tavares Rodrigues.

E porque estarei presente no lançamento e a bondade do autor e do editor me estenderam um tapete de responsabilidade, sinto agora aproximar-se uma leve inquietude na hora do acontecer.

2 comentários:

Justine disse...

Será certamente um dia de festa grande e merecida, para o autor e para a apresentadora!
Parabéns a ambos:))))

Rocha de Sousa disse...

Que bom que tivesse sentido essa
breve ponta de ansiedade: porque ela é o palpitar do cérebro, da razão da consciência, o medo de
estar à altura de uma longa viagem
e saber-se que depois dela vem a quietude. Urbano engana-se, não
podia apresentar a minha obra: por-
que a tensão de Angola 61 é para se
saber, no 20ª ano depois da guerra,
o que um coração ainda inquieto po-
de contar, em verdade, sem a bela mentira de Copola.