Eu vigio a minha permanência na terra,
leito eficaz para cada um engrandecer
diariamente. Não posso portanto permitir
que alguém, de quem não considera este clarão
diáfano necessário à compreensão,
queira incutir no espírito humano
a ideia de uma essencialidade colectiva
desenraizada daquele fundo com que cada um
se torna essencialmente em ocasiões únicas
o ordenador de rosas registadas por sinais.
Fiama Hasse Pais Brandão
O mar é sempre aquele esplendor, misto de beleza, domínio sobre a areia que move a seu bel-prazer, sobre as rochas onde se quebra e revolta e vai e retorna e não desiste no seu bailar de força e submissão. Em dias de vento, longe, longe, encaracola e desliza em cabeleiras de espuma, corre, corre até à areia que o espera para os abraços e requebros qual dança de salão, abrindo as saias em rodopios, em sons e suspiros de compasso nunca esgotado.
O mar atrai e mete medo a um só tempo. Deve ser atávico o chamamento da água, quem sabe a ancestralidade da nossa vocação marítima, nem só os descobrimentos, antes, muito antes Ulisses, antes muito antes os Fenícios, antes muito antes e sempre e sempre o líquido amniótico.
«Eu vigio a minha permanência na terra,
leito eficaz para cada um engrandecer
diariamente.»
Olhar só por olhar, o mar engrandece e enobrece tudo. A alma, o espírito, os sentidos, até os ócios, as vontades, as mágoas, as saudades. É um leito macio que embala só de olhar as ondas. O tempo passa e o mar permanece porque é eterno o seu marulhar escutado no búzio malhado, é eterna a volúpia a afagar os corpos, será eterno o prazer de velejar, de cavalgar a onda, de desvendar as profundezas, tão só de mergulhar e conhecer segredos guardados pelos séculos.
É um tálamo fecundo para quem é temerário.
«Não posso portanto permitir
que alguém, de quem não considera este clarão
diáfano necessário à compreensão,
queira incutir no espírito humano
a ideia de uma essencialidade colectiva
desenraizada daquele fundo com que cada um
se torna essencialmente em ocasiões únicas
o ordenador de rosas registadas por sinais.»
Nem todos sabem ler os clarões que diviso diáfanos, quem sabe os vejam velados, toldados pela razão dos dias, sem a razão dos séculos entretanto guardada nos fundos da memória. Espanto-me frequentemente com o caminhar do sol, com a volta da lua, com o céu carregado, que num repente se rasga em luz, destapa em água e sorri num – quantas vezes dois! – arco-íris.
Nem sempre soube ler os sinais; continuo a procurar a mestria.
Sei que eles ocorrem no tempo certo.
Como as rosas sempre florescem.
2 comentários:
Mesmo que não saibamos ler os sinais eles ocorrem... e os sinais creio não se aprendem a ler leem-se simplesmente ou não... mas tudo muda... nada é imutável, um dia não sabemos ler os sinais no outro eles são-nos claros.
Tu sabes ler e sabes deixar sinais, sabes deixa-los espalhados pela tua escrita e eu adoro apanhá-los com os olhos da alma.
Um abraço.
Isabel
os sinais estão sempre presentes...é tudo uma questão de maior ou de menor atenção, de onde resultam sempre consequências que nos irão afectar no decurso da nossa vida.
Enviar um comentário