como a só presença com que me perdoas
esta fidelidade ao meu destino.
Quanto assim não digas é por mim
que o dizes. E os destinos vivem-se
como outra vida. Ou como solidão.
E quem lá entra? E quem lá pode estar
mais que o momento de estar só consigo?
Diz-me assim devagar coisa nenhuma:
o que à morte se diria, se ela ouvisse,
ou se diria aos mortos, se voltassem.
Jorge de Sena
Muda a paisagem e o olhar é novo, desvenda-se o casario colina acima, não apenas de brancura, mas cores fortes quebrando a monotonia, lembrando os novos tempos e os novos gostos.
Não mais os choupos respondendo ao vento, dobrando-se em vénias, semeando brancura nas primaveras, não mais os braços vazios enfeitando as nuvens por entre a bruma nos invernos frios, apenas um choupo varrendo as folhas balouçadas pelo chão, quem sabe chorando penas e ausências.
Nem melhor, nem pior, apenas diferente.
Como por dentro tem de mudar o que quer manter-se inteiro, não mais a plenitude e a força, mas a dignidade que o tempo não apaga e segue escolhendo o caminho das pedras que afloram para a travessia do rio que não se detém, mau grado a poluição que lhe tira o brilho. Mas as rochas estão lá, de pedra, firmes, cada vez mais a erosão dos ventos fortes, das águas moendo as arestas lhes dá a doçura do toque, a beleza do arredondado, quantas vezes vestindo de musgo os tons de cinza e negro.
A fidelidade ao que somos é um suspiro de vida, é um refúgio de ternuras e carências, de lágrimas e de risos, é a escrita real da nossa presença no mundo, sem outro espaço que o de partícula no núcleo. O átomo, somos nós.
2 comentários:
A coerência é um modo de sobrevivência, é um "dizer devagar" o que somos e queremos continuar a ser.
invejavel talento o teu - de assim dizeres com elegância e sabedoria.
beijos
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