quinta-feira, junho 05, 2008

O fogo e a vida

Meu pai montava a cavalo, ia para o campo.
Minha mãe ficava sentada cosendo.
Meu irmão pequeno dormia.
Eu sozinho menino entre mangueiras
lia a história de Robinson Crusoé,
comprida história que não acaba mais.

Minha mãe ficava sentada cosendo
olhando para mim:
- Psiu...Não acorde o menino.
Para o berço onde pousou um mosquito.
E dava um suspiro...que fundo!

Lá longe meu pai campeava
no mato sem fim da fazenda.

E eu não sabia que minha história
era mais bonita que a de Robinson Crusoé.

Carlos Drummond de Andrade






Entre a flor e o fogo, eu prefiro a flor. Pela cor, pelo odor, pela alegria, pela compostura. Mas o que mais me atrai é o fogo.

Também pela cor, pelo bailado da chama, mais pela dor do crepitar, pelo calor, pela quietude tornada brasa. Depois a cinza, ainda quente, a seguir morna, e finalmente pó, cavalgando o vento. Assim todos os seres viventes têm um ciclo a cumprir.

Entre os humanos, a organização das sociedades visou, desde os primórdios, a melhoria de vida das populações. A partilha de serviços responsabilizou cada um, formando uma cadeia de elos a não quebrar. As religiões tiveram aí um papel preponderante enquanto detentoras de um poder espiritual e a ciência avançou quebrando todas as peias, singrando as águas e voando nos céus. Encontrou o negro, para além do azul, no espaço sideral.

Lá em cima, o brilho das estrelas faz esquecer tudo o resto. Cá em baixo, assediados pela ferrugem, os elos enfraquecem. O peso é enorme. Seis mil milhões e meio depois, parece chegar por aí o número mágico de todos os «seis», a atingir neste ano de 2008. Alguém vai nascer e atingir esse número. Um novo Anjo da Luz?

E o ouro negro submergindo tudo.

Qualquer dia o nosso planeta já não é azul.

9 comentários:

Nilson Barcelli disse...

Depois de um belíssimo poema de um grande poeta, li o teu texto e gostei.
A relação que estabeleces entre a flor e o fogo, é interessante.
Abraço.

scaramouche disse...

divino.

abraço,
scaramouche.

dona tela disse...

Tenho lá um desafio muito giro.

P.S. Então é assim: Como ainda não sinto categoria para comentar, vou deixando o mesmo recado em todos os senhores(as). Certo??


Até logo.

Justine disse...

Encantador de simplicidade, o poema do CDA. Do tempo em que o nosso planeta ainda era azul...
E se já não é, temos todos responsabilidade nisso.

Manuel Veiga disse...

flor e fogo. imagem "explosiva"!
muito bela.

gosto muito de ler-te.

Rafael Almeida Teixeira disse...

Jawaa!

Que imagens lindas. Elas serviram de modula para seu texto que fora pincelado com sentimentos diversos.

Concordo que qualquer dia desse o planeta não será mais azul.

PS: Amiga sinto sua falta.

\O/ afetuosos.

dona tela disse...

Andei na passeata. Gostei.

Uma noite descansada.

Rocha de Sousa disse...

Os seus comentadores, aqui mesmo ao lado, deixam-se fascinar, e com
razão, pela beleza das flores e harmonia do texto. A verdade é que,
numa época das mais encantatórias
tecnologias, os objectivos do homem
continuam a assentar na lei do mais
forte e cegamente na dependência quase exclusica do crude. Uma espe-
culação como a actual antecipa o que será o mundo atrasado do essen-
cial perante as sucessivas catás-
trofes em redor, doente o próprio
planeta. As sociedades insistem em
crescer +mais+, à maneira faraóni-
ca e mesmo assim as torres cairam
a um sopro de raiva. Crescer não é
desenvolver. Uma evolução serena
passa certamente pela equilibrada
ocupação da terra e não nas concen-
trações em cancerígenas «metrópo-
les». Infelizmente, parece que o limite chegará mais cedo ainda com disparidades inexoráveis entre os muito ricos e os cada vez mais pobres.
Sem metáfora, o céu negro em vez de
azul munca foi menos ficção.
Rocha de Sousa

dona tela disse...

O que é esta história dos irlandeses?

Desculpe incomodar.