«Aproveitar o tempo!
Tirar da alma os bocados precisos — nem mais nem menos —
Para com eles juntar os cubos ajustados
Que fazem gravuras certas na história
(E estão certas também do lado de baixo que se não vê) …
Pôr as sensações em castelo de cartas, pobre China dos serões,
E os pensamentos em dominó, igual contra igual,
E a vontade em carambola difícil.»
Fernando Pessoa
Quando a noite vem chegando e apaga devagarinho o brilho das gotas de chuva pousadas nas rosas que vão abrindo, outro brilho se acende no interior das casas, roubando a cada um de nós o sabor do escuro quieto de fim de dia. O acender da lareira com pinhas secas, depois as labaredas lambendo o azinho, deixando sombras e luz nos objectos em volta, o gato aninhando-se no quente. Já nem há candeeiros para acender. E os poucos que o fizeram noutros tempos, depressa esqueceram o ritual.
O brilho que se acende nas casas tem luz e tem som e movimento. Tem melodias e cor. Traz cultura de outras gentes, mas nela muito mais dor. Traz o mundo ao contrário de alguns anseios, traz um espelho de Bosh: um homem barbado, ufano da sua gravidez avançada; uma criança em gestação que vai nascer diferente, vai nascer de um pai; um homem negro, bem longe da civilização dos seus ancestrais, enfrenta os microfones do mundo e anuncia, em nome de um chefe de estado: «Estamos a preparar uma guerra contra o povo!»
O milénio avança e os humanos adaptam a si as transformações em catadupa.
Assim continua o poeta.
«Imagens de jogos ou de paciências ou de passatempos —
Imagens da vida, imagens das vidas. Imagens da Vida.»
2 comentários:
Só sobre as imagens desse lindo post:
Três flores, três botões.
\o/ afetuosos
Imagens lindas, como pérolas de lágrimas.
Enviar um comentário