Conscientemente escrevo e, consciente,
medito o meu destino.
No declive do tempo os anos correm,
deslizam como a água, até que um dia
um possível leitor pega num livro
e lê,
lê displicentemente,
por mero acaso, sem saber porquê.
Lê e sorri.
Sorri da construção do verso que destoa
no seu diferente ouvido;
sorri dos termos que o poeta usou
onde os fungos do tempo deixaram cheiro a mofo;
e sorri, quase ri, do íntimo sentido,
do latejar antigo
daquele corpo imóvel, exumado
da vala do poema.
Na História Natural dos sentimentos
tudo se transformou.
O amor tem outras falas,
a dor outras arestas,
a esperança outros disfarces, a raiva outros esgares.
Estendido sobre a página, exposto e descoberto,
exemplar curioso de um mundo ultrapassado, é tudo quanto fica,
é tudo quanto resta
de um ser que entre outros seres,
vagueou sobre a Terra.
António Gedeão
4 comentários:
Não sabia da teu encanto por marcos geodésicos, ah,ah,ah!!!!!!!!
Beijo
Falei com A. Gedeão no Pedro Nunes. Mal sabia que estivera a conversar com o autor de uma das obras poéticas mais fulgurante da literatura portuguesa.
Boa escolha
:)
Na História Natural dos sentimentos tudo se transforma, mas o essencial é igual.
António Gedeão é um dos meus poetas favoritos. **
Tudo se transforma... diz o poeta. Que tudo transforma. Que tudo reinventa. Mais que o cientista? Talvez. O poeta sabe. O cientista procura. O poeta também. O cientista nem sempre.
Mais umas palavras que uniram!
Cumprimentos.
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