«…O tempo a elas deve
a solenidade esbelta
com que nos aparece
às vezes como poalha
esgueirando-se entre troncos.
O tempo a elas deve o nosso
afecto pelo tempo. Servi-
doras e devotas, coisas
mesquinhas, cheias de linhas
nítidas, contornadas por uma
claridade enérgica diária.»
Fiama Hasse Pais Brandão
Nunca tive jeito para fotografias. Complexo. Por mais que me esforçasse, o resultado era sempre desastroso: a nitidez, não estava lá, o enquadramento deixava a desejar. A culpa não era minha, era da miopia… depois tinha de acertar uma celebérrima luzinha amarela e eu, concentrada em focar um ponto determinado demoraaaaaava um certo tempo; isso impacientava quem esperava que eu fosse mais lesta no ofício; se ainda me fosse preocupar com o enquadramento conveniente nunca mais era, e acabava disparando aos tremeliques. Para ser menos cáustica, as minhas fotografias deixavam a desejar. Achei sempre mais conseguidas as fotografias dos outros e há que reconhecer que não se pode saber tudo.
Vem-me agora à memória, como um flash, um mini-curso que fiz em Poitiers sobre fotografia, durante um estágio. No final havia um trabalho a apresentar e foram-nos distribuídas máquinas fotográficas para que pudéssemos ilustrar o tema que escolhêramos. Nós próprios revelávamos as nossas fotos. Divertidíssimo! Fechados numa câmara escura, colocávamos o rolo num produto e rodávamos o mesmo para a direita, depois para a esquerda, um determinado número de vezes, se nos enganássemos estragava-se tudo. O meu grupo apresentou antes em diapositivo, porque era mais fácil. Foi apenas uma semana, para que pudéssemos concluir devidamente o nosso estágio na OAVUP. Fiquei com algumas luzes, mas não foi o suficiente para me entusiasmar.
Ainda tenho comigo a máquina fotográfica de casa dos meus pais, aquela que tirou as fotos – a preto e branco - que tenho aqui apresentado da minha infância. É uma preciosidade. Continua dentro do estojo negro, que aparece a tiracolo da menina que eu era, aqui junto de minha mãe. Também tenho guardada para a posteridade a que usei para marcar os momentos capitais dos meus pequenos, comprada por seu pai, ainda solteiro, com o primeiro ordenado recebido como oficial miliciano, ainda em Coimbra, por final dos anos cinquenta. A velocidade, direi a voracidade, da ciência trouxe até mim a máquina digital dos tempos modernos. Aí consigo finalmente captar uma razoável imagem entre cada cinco, enfim, passe a imodéstia...!
Tudo isto para revelar a quem me lê que todas as fotografias que constam do meu blog, inclusive as do Flickr, são prata da casa. Quando isso não acontece, eu dou a indicação da origem. Só que a casa não sou precisamente eu e já confessei acima as minhas incapacidades. Quase todas são da autoria de minha filha, e eu aproveito uma ou outra porque as acho bonitas e porque de algum modo se enquadram no que escrevo. Isto principalmente para responder à Daniela cujo olhar me seduz e é sempre tão amável nos comentários. O post da esperança em verde foi carinho de irmã, apenas para lembrar ao filho ausente e distante a feira mensal da sua infância, hoje deslocalizada (há que entrar na onda…) por força do progresso, que deixou memórias diferentes numa e noutras mentes: eu, professora, paraquedista recém-chegada de outro continente, horrorizada com os ruídos e animais de grande porte entrando Externato adentro em cada dia seis; ele, ela, crianças ansiosas em cada mês pela excitação daquele dia diferente, forçadamente de aulas diferentes…
5 comentários:
Gostei do que explanaste e principalmente da foto, que deve ter sido tirada mais ao menos na altura em que nos conhecemos pela primeira vez.
Tudo de bom para ti.
Um beijo
Como uma fotografia comporta um milhão de histórias... Hoje, talvez seja um pouco ao contrário, não? Inventa-se uma boa história a partir de um milhão de fotografias... Talvez não.
Eu gosto de não perceber muito de fotografia e de sentir a surpresa do que acontece quando carrego no botão. Como se fosse uma prenda para mim! Que depois partilho com os outros, claro.
Beijo
Jawaa:
Ainda que não sejas uma fotógrafa de mão-cheia, possuis certamente uma mão-cheia de recordações felizes...registadas pela "máquina" mais complexa de sempre: o cérebro humano.
Desejo que o teu "álbum da vida" continue a ser tão bem preenchido de momentos felizes como até aqui.
Obrigado pela generosa partilha e pelos amáveis comentários...
Um grande bem-haja,
Pain-Killer
Amiga Jawaa, fiquei sensibilizada com este "post" e com a parte que me toca!
Gostei muito de conhecer mais um pouco de ti e sinto-te como uma mulher BELA, RICA, CORAJOSA e GRANDIOSA como ser humano.
Aproveito para agradecer o teu "olhar"...
Um beijinho especial
com carinho
Daniela
Ok ficou registado ;) lol
Beijos alienígenas
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