As entradas marcadas por árvores em alas são sempre um convite à intimidade que nos vai faltando nas zonas urbanas ou urbanizadas em que a solidão é ruidosa e por isso dói mais.
A solidão mentirosa no fundo das áleas, sejam de plátanos ou castanheiros, já ficou nos verdes que falam da natureza que somos, da pureza inicial onde regressamos paulatinamente, caminhando devagar, com a delicadeza das folhas que se desprendem e caem sobre nós como um afago.
Se houver tempestades, façamos por gerir os estragos, serenamente, porque ela passa e nós ficamos. Varrer as folhas no chão, escutar a brisa que resta, procurar no céu as estrelas, encontrar a nossa. Depois, olhar para ela, fixá-la como um espelho.
Temos brilho, energia, cintilamos entre todas as que nos rodeiam, há em nós uma força que parece extinta quando o sol é o astro maior, mas é avassaladora quando a noite chega. Nós cintilamos ainda e, mesmo perecidas, ainda há olhos que nos vêem, séculos adiante.
Temos o hábito que nos inculcaram de olhar o mundo de dia e a cores, mas a noite é parte integrante do dia, só alguma pobreza de língua impede a utilização aqui de vocábulos distintos. A natureza de noite é mais forte, mais rica, mais produtiva. O dia fornece-lhe a energia mas queima e agride, tanto mais, quanto mais quente a atmosfera. A noite cálida proporciona o bem-estar, a digestão perfeita da energia acumulada. A subtileza do escuro faz emergir as sensações obliteradas pela luz, a voluptuosidade dos cheiros, dos silêncios, do encontro dos corpos. A visão esmorece, mas tudo é tão mais forte que mesmo o olhar encontra o que apenas se adivinha.
Na praia, a areia morna nos pés descalços é um prazer sem tamanho. Se a onda chega, devagar, traz consigo os sonhos perdidos, os risos na espuma branca, os segredos sussurrados nos búzios, ouvidos dentro, destapados num sorriso, num afagar de mãos.
A solidão é mentira.
7 comentários:
caminhando devagar uma estrada, que nos leva sabemos lá onde, ladeados de verdes lembranças. No horizonte... um azul translúcido e infinito espera-nos. Quando chegar a nossa vez vamos saber!
Bj deste seu Pingo, agora azul como o ceu.
Creio que o homem sonha unicamente
para não deixar de ver;
pode acontecer que um dia
jorre a luz interior em nós
e nenhuma outra nos será mais necessária.
Goethe , Johann
Visto assim minha amiga... e a tua visão é maravilhosa... sem duvida... que grande mentira é a solidão.
Até breve, minha amiga ... não sabes o encanto que sempre ler-te.
Isabel
Minha cara,
A isabel disse bem. Também gosto de
a ler, eu que até me divido pelos temas e esta mania d falar sobre o
mundo.Andei por aqui em ronda e vi e li este seu belo texto.É apertado
de afecto e entrega ap prazer de estar. Fala de um mar que parece tropical e eu que fiquei sempre com
saudades de Angola.
Ultimamento, em «desenhamento»
tenho tratado de temas actuais mas
apelam à nossa intervenção.
Rocha de Sousa
A solidão só existe quando realmente nos sentimos vazios, quando não estamos capazes de olhar ou agarrar seja o que fôr!
A solidão é mentira sim, quando se consegue estar connosco mesmos (preenchidos e felizes), quando se consegue absorver a natureza das pessoas e das cosias.
Somos nós e o mundo, o mundo e nós.
Gostei muito dete breve e belíssimo texto, tão cheio de sensações, sentimentos... cheio de vida.
Jawaa, vivo momentos de felicidade (tu sabes muito bem, pois tens vindo a acompanhar)... solidão em mim, é que não existe mesmo! Hehehehe
Um BOM FIM DE SEMANA
beijinho
Daniela
Amiga Jawaa, voltei porque me esqueci de te falar nas fotografias do post anterior!
Julgo serem tuas! Gostei muito! Foi um registo especial, num lugar que se prestou para tal.
Tiveste sensibilidade para captar estes momentos de contúdo fresco, saudável...
Um beijinho
Daniela
Belo este pensar, belo este sentir, bela esta alma. Obrigada por este momento de partilha em que respirei através das tuas palavras.
Bjs. Bom fim-de-semana.
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