«Rolávamos na vertente de uma serra, sobre penhascos que desabavam até largos socalcos cultivados de vinhedo. Em baixo, numa esplanada, branquejava uma casa nobre, de opulento repouso, com a capelinha muito caiada entre o laranjal maduro. Pelo rio, onde a água turva e tarda nem se quebrava contra as rochas, descia, com a vela cheia, um barco lento carregado de pipas. Para além, outros socalcos, de um verde pálido de roseda, com oliveira apoucadas pela amplidão dos montes, subiam até outra penedias que se embebiam, todas brancas e assoalhadas, na fina abundância de azul.»
Eça de Queirós
Neste final de semana Joe Berardo invadiu-me a casa, despudoradamente, através das capas das revistas que semanalmente chegam. Um exagero, se tivermos em conta que pelo pior dos motivos, o futebol, o Benfica ainda por cima - logo eu, que tenho um fraquinho pelo Sporting!
Mas Berardo é também muito mais outra coisa, além de querer comprar o Benfica. É o Museu Colecção Berardo – Arte Moderna e Contemporânea no CCB e a Quinta dos Loridos, no coração do Oeste, bem perto da A8, à saída para o Bombarral.
Aqui também uma casa nobre, sem capela à vista; para rezar, duas altas magnólias em flor, oliveiras e sobreiros centenários. À direita, no meio de uma ala, uma porta ornamentada a pedra esculpida, representando a colheita e anunciando os vinhos; um vinhedo extenso, e mais outro além, devidamente ordenado para um regadio dependente de novas tecnologias. Estamos no século XXI.
A imponência prenunciada surge em seguida, quando a Quinta dos Loridos se descobre, reverenciada por duas estátuas enormes de cães orientais em granito, abrindo-se em ruas e estradas entre relvados e pedras e sobreiros centenários e mata de azinheiras, medronheiros, loureiros e olorosas madressilva e murta, esta ponteada agora de florzinhas brancas.
Multiplicam-se pelos caminhos estátuas magníficas em granito e em mármore, levando-nos ao esplendor do Oriente, ícones doutras civilizações que nos deslumbraram cinco séculos atrás. Monges budistas em oração deixam em nós a marca da quietude e singeleza das suas vidas; descendo um pouco, olhamos o lago imenso onde a nobreza da estatuária convive com a singeleza dos patos-reais que por ali aspergem um ruído venturoso.
Para aquele lugar não há palavras. Só sentir.